Registro Histórico




RUA LACERDA SOBRINHO (Antiga Rua Sacramento)

            Com a construção da capela em homenagem ao Santíssimo Salvador, em 1745, contígua à Capela de Nosso Senhor dos Passos (FEYDIT, p. 319), numa área de tabuleiro à margem do Rio Paraíba do Sul, estilo livre das enchentes, houve a necessidade de se criar algumas vias para a mobilidade urbana, de veículos de tração animal, de pessoas, tilburis e etc. e essas artérias, que serviam, também, para escoamento da produção que aqui chegavam pelos diferentes portos da estrada líquida do rio, era s hoje Ruas Lacerda Sobrinho, Inácio de Moura, Vigário João Carlos e a própria Beira Rio, 21 de Abril e Sete de Setembro.
            Seguindo o conceito arquitetônico da época, as casas eram na maioria, no alinhamento da rua, de modo que, seus moradores pudessem das janelas observar o movimento nas ruas. Muito comuns, os sobrados eram, no alto, moradia dos comerciantes e em baixo suas lojas comerciais. Hoje, mantendo a mesma paisagem urbana, verifica-se que as construções baixas para residências foram transformadas em lojas refletindo uma tendência dessa via pública.
            Contudo historicamente, Ayres Cabral (apud Feydit), escrevendo sobre a Vila de São Salvador, diz em uma nota da página 42 de sua Corographia Brasilica: “Salvador Correa mandou fundar no seu terreno, em 1652, uma ermida dedicada a São Salvador, e entregou-a ao cuidados dos MM. Beneditinos, fazendo-os de mais a mais (e bem injustamente) juízes eclesiásticos”. O grifo é do próprio Feydit, que se posicionava contrário à posição de beneditinos e jesuítas na questão fundiária na antiga Vila de São Salvador de Campos dos Goytacazes. (Página 258).
            Na página 260, Feydit assinala: “Vamos retificar alguns pontos que com foros de verdade correm impressos em relação à história de Campos dos Goytacazes”. E cita:
            “(...) A Matriz de São Salvador foi edificada em 1948, e não em 1652, o que se conclui do requerimento apresentado em vereação de 3 de abril de 1653, e por nós já transcrito”. Com isso fica clara a idéia de que o “terreno” (lugar da praça) já era usado com este fim no século XVII e a igreja, sua principal edificação, provavelmente começou a ser construída em 1648 sendo inaugurada (três anos depois) em 1652, não havendo nenhuma contradição histórica (...).
            Presume-se que a praça chamada de Principal, já existia, então, antes da construção da igreja de São Salvador, usando de materiais de alvenaria e telhas fabricadas com a argila abundante nesta região.
            Mas, no momento, o mais importante é a Rua do Sacramento, uma alusão às igrejas da Praça Principal. Teve, até a nomenclatura atual, várias denominações: Estrada do Queimado, porque por ali se podia chegar ao Passeio Municipal, aberto para a construção da estrada de ferro, e de lá atravessando o Canal Campos-Macaé e, finalmente à Usina do Queimado.
            Teve, também, o nome de Dr. Porciúncula e, após (e agora definitivamente) Lacerda Sobrinho, uma homenagem ao médico humanitário, cuja biografia, de autoria do historiador Waldir Pinto de Carvalho, (“Gente que é Nome de Rua”, p. 245/246), diz o seguinte: “O Dr. João Batista Lacerda Sobrinho, filho do Comendador Luiz Carlos de Lacerda, nasceu em Campos em 1880, casado com a Senhora Judith de Lacerda e pai de duas filhas, que ficaram órfãs, pois o seu falecimento ocorreu no dia 16 de agosto de 1906. Tinha ela apenas 26 anos de idade e serviços prestados à medicina e à cidade em que nasceu”.
            Justamente com os médicos Dr. João Manoel da Silva Tavares e Dr. Luiz Cardoso de Melo, lutou desbravadamente contra o chamado “Mal Levantino” (Peste Bubônica) que, naquela época levou a óbito cerca de um terço da população. Os três morreram em pleno exercício da medicina. Lacerda Sobrinho (26 anos), em 16 de agosto de 1906; Silva Tavares (38 anos), em 17 de agosto de 1906; e Cardoso de Melo (45 anos), em 22 de agosto de 1906.
            Com a abertura da Praça da Repúblicam, que era denominada de Cercado de São Francisco e depois Praça do Imperador, isso em 1851, a Rua do Sacramento já tinha o seu traçado definido naquela área e, embora a rua terminasse, enquanto rua, no prédio do Comendador Saturnino Braga (atual sede da Escola Estadual XV de Novembro), podia-se caminhar até o Passeio Municipal e de lá à Usina do Queimado, por uma pista sem nenhum calçamento e plena de buracos.
            Na Praça, em lugar de destaque, há um busto em homenagem ao ilustre campista, vítima da peste bubônica, contra a qual lutava para salvar a cidade dessa epidemia de péssimas consequências para a população.
            Apenas uma curiosidade: A Rua Lacerda Sobrinho termina na Rua Cardoso de Melo que, dentro do plano geográfico, localiza-se paralela à rua Silvio Tavares.

Centro Histórico

            O centro histórico da cidade de Campos dos Goytacazes foi praticamente consolidado, a partir do Plano Urbanístico do sanitarista Francisco Rodrigues Saturnino de Brito, planejado em 1902, muito embora as obras de organização urbana somente tenham sido iniciadas após 1906, como registra a pesquisa da Dra. Teresa de Jesus Peixoto Faria, no texto “As reformas urbanas de Campos e suas contradições”.
            Ela cita, em sua pesquisa, que havia, além da reformulação urbanística, a necessidade de resolver questões d falta de saneamento, responsável pelas epidemias, como a peste bubônica, que assolou o município, situação agravada pela grande enchente verificada naquele ano, resultando em inundações, o que levou o médico Dr. Benedito Pereira Nunes, idealizador da “cidade saneada”, a observar que, em 1906, nada tinha sido feito com relação ao projeto de Saturnino de Brito. E fez o seguinte discurso, publicado na Gazeta do Povo, solicitando a intervenção do Governo Federal:

Em 1901, quando presidia a Câmara Municipal de Campos, eu disse que, realmente, Campos, doada de uma natureza e de situação topográficas excepcionais e que poderia ser chamada a Sultana da Paraíba se transformou, por negligências da engenharia indígena e da edificação colonial numa cidade de ruas tortuosas, de becos e de ruelas escuras, cheia de casebres obscuros e insalubres, criando, assim, um ambiente de condições idênticas às das cidades asiáticas, onde a peste é endêmica. Os velhos casebres que existem ainda hoje e onde vive a classe operária pagando baixos alugueis, confirmam este estado de coisas. Atentados flagrantes às regras de higiene, legitimando de maneira criminosa o direito dos proprietários pouco escrupulosos, exploradores conscientes dos pobres moradores de casebres úmidos, verdadeiros pardieiros pagos com o suor das vítimas.


            Tetê Peixoto assinala: E é o próprio prefeito Ferreira Landim que, em novembro de 1906, anuncia, em discurso também publicado no mesmo jornal, no qual fala nas dificuldades para colocar a arquitetura de suas habitações de conformidade com os novos modelos em difusão: “O problema de salubridade das habitações exige, mais do que nunca, a atenção do poder municipal. É necessário melhorar as condições de higiene das casas, transformar o sistema de edificações, expurgar a cidade dos velhos casebres, focos de infecções de toda a espécie – da tuberculose e da peste, principalmente. No ano passado, fiz demolir nos termos da lei, 45 desses velhos pardieiros e as enchentes completaram, em parte, esta obra de saneamento (...)”. A reforma urbana na cidade de Campos dos Goytacazes obedecia, em tese, ao que era feito no Rio de Janeiro, nos tempos de Pereira Passos, por volta de 1904.
            Da lista de demolições de velhos edifícios, publicados em seu trabalho, que parecem prejudicar a imagem da cidade constam 32 demolições e foram condenados 16; construíram-se nove casas novas; 18 foram totalmente reconstruídas, e 16 parcialmente; foram feitos 48 grandes reparos e 217 pequenos reparos. E o Dr. Pereira Nunes, condenou a cidade “velha”, segundo ele, invadida por ratos. E reafirma que “Campos reclama de medidas como impermeabilização do solo e a abertura de áreas de circulação”,
            No documento, a pesquisadora salienta (...) O velho tecido urbano é transformado, progressivamente, graças às reformas que visam, além do embelezamento da cidade, dar-lhe uma melhor funcionalidade, adaptando-a aos interesses da economia capitalista e da burguesia em plena ascensão. Finalmente, neste começo do século XX, é necessário dotar a cidade dos símbolos do progresso e de uma imagem de modernidade.
            E ele descreve algumas mudanças operacionalizadas com as reformas do Plano Saturnino de Brito: “As Ruas: 21 de Abril, Sete de Setembro, Constituição (Rua Alberto Torres) e Formosa (Tenente Coronel Cardoso) foram alargadas; a antiga Praça das Verduras (Praça do Chá-Chá-Chá) foi urbanizada e transformada em praça de lazer; a Praça São Salvador, já com belo jardim, é ornamentada com uma fonte, os edifícios se renovam como o Renne, o Café High-Life,m Bom Marché e novos edifícios surgiram, como o do Banco do Brasil (1910), Associação Comercial de Campos (1913), Correios e Telégrafos e sede da Lira de Apolo (1917) e o antigo Teatro Trianon (1921). Desses citados, somente sobreviveram o Renne (com mudanças nos anos 50) e a Lira de Apolo (ora em restauração).
            Hoje, o conjunto de obras ecléticas, o maior do interior do Estado, praticamente está restrito às Ruas: 21 de Abril, Santos Dumont, Teotônio Ferreira de Araújo (antiga Barão de Cotegipe), Praça do Santíssimo, Sete de Setembro, 21 de Abril, Avenida Rui Barbosa, Rua 13 de Maio (antiga Rua Direita) e Rua Formosa (Tenente Coronel Cardoso), embora existam outros espécimes da época espalhados por outras artérias da cidade, atingindo até bairros mais distantes e em alguns distritos, como Goytacazes, Dores de Macabu, Murundu, Santa Bárbara, Vila Nova, Morro do Coco, Santa Maria e Santo Eduardo. Só para citar alguns...
            O centro histórico de Campos é, com outros avanços ocorridos nos anos 40, por intervenção da empresa Coimbra Bueno, nos tempos áureos do Prefeito Salo Brand, que era engenheiro, o que estabelece a Lei (Plano Diretor) 7.972, de 30/03/2008, quando se inicia, embora tardiamente, a se adotar uma política de preservação do patrimônio Histórico e Cultural do Município, cuidando de suas instâncias materiais e imateriais.

Inventário em: 22/05/2015
Fotografia: Valdimir da Silva Salino
Responsável: Orávio de Campos Soares

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